Harry Houdini ainda hoje é considerado o maior ilusionista e mestre de escapadas da história.
Além de ser um fantástico expert em fugas, Houdini foi também astro de cinema, produtor teatral, piloto de avião, estrela do show-business e promotor de suas próprias façanhas. Ele ainda se tornou famoso a partir da década de 20 por desmascarar médiuns fraudulentos.
A vida de Harry Houdini foi cheia de emoções e de momentos dignos da ficção. Pouco antes de morrer, o grande mágico teria dito a um repórter: "Se a lenda é maior que a realidade, prefira falar sobre a Lenda".
Muitas partes da vida de Houdini permanecem sendo um mistério e ele próprio parecia preferir dessa forma. Mas os fatos demonstram que sua vida foi mais atribulada do que se pode imaginar.
Houdini nasceu em 1874 em Budapeste, Hungria com o nome Erich Weiss, mas se criou na pequena cidade de Appleton, Wisconsin. Seu pai era um rabino conhecido pela seriedade e postura conservadora diante da comunidade.
A família era muito pobre e todos os filhos tinham de trabalhar para ajudar. Aos 12 anos Erich engraxava sapatos, lavava roupa e vendia jornais. Conta-se que o jovem Erich também foi aprendiz de chaveiro e ainda muito jovem aprendeu os segredos de trancas e fechaduras que podia desmontar de olhos vendados. Se essa parte da história é verdadeira esse foi um ofício que muito o ajudou anos mais tarde.
O rabino Weiss decidiu se mudar para Nova York, imaginando que um professor de religião poderia ter mais sucesso na sua profissão se estivesse próximo de uma comunidade judaica maior. Os Weiss se instalaram em um velho cortiço em Manhattan, oito pessoas morando em um quarto e sala.
Ilusionismo era apenas um dos passatempos de Erich até que ele leu a biografia do mágico francês Robert Houdin. Erich passou a se espelhar naquelas memórias e mais do que qualquer outra coisa desejava ser um mágico profissional. Ele deixou seu primeiro emprego fixo, e ajudado por um colega começou a se apresentar em bares, teatros e modestas casas de espetáculo.
Assumiu o nome Houdini, baseado no nome utilizado por Robert Houdin. Com um começo pouco auspicioso, Houdini se apresentava ao lado de encantadores de serpentes, equilibristas, comedores de fogo e outros circenses por alguns trocados. Os amigos conheciam Houdini como “Ehrie”, portanto a tradução americana para o primero nome foi quase instantânea, ele se tornou Harry Houdini. Para seus parentes, no entanto, ele sempre seria Erich.
Depois da morte do pai, Houdini assumiu a responsabilidade pelo sustento da família e jurou que nada faltaria a sua mãe. Essa promessa não era sequer necessária. Erich amava profundamente a mãe, Cecilia, uma das únicas pessoas que haviam apoiado seu sonho de ser um artista. Houdini continuou a viajar e se apresentar.
Inventou uma ilusão chamada “Metamorphosis”, que envolvia sua assistente ser trancada em uma caixa e depois de uma cortina ser baixada, Houdini a substituir em seu interior. Ninguém desempenhava esse truque tão bem quanto Bess, a assistente favorita de Houdini que acabou se tornando sua esposa. Houdini conheceu Wilhelmina Beatrice Rahner enquanto se apresentava em Coney Island. Ele tinha 20 anos quando impulsivamente pediu em casamento a jovem que tinha um número de canto e dança. Harry e Bess se apresentaram por 26 semanas consecutivas em 1895 tornando-se uma sensação na Feira Mundial de Chicago.
Nos momentos livres Houdini brincava com seu novo hobby: algemas. Ele descobriu que tinha um dom quase sobrenatural para escapar delas. Um mágico leva em média 15 segundos para abrir uma algema, Houdini era capaz de escapar em meros 6 segundos. Confiante de sua habilidade ele desafiou o Departamento de Polícia de Nova York a construir uma algema da qual ele não conseguiria escapar. Eles apresentaram seis modelos e Houdini abriu cada um deles facilmente.
Esse foi o início da carreira de Houdini como promotor de suas próprias habilidades. Ele comprava espaço em jornais da época anunciando números mirabolantes que eram realizados nas ruas e convencia jornalistas a cobrir suas façanhas. O nome de Houdini começou a circular e ele ficou conhecido como "O Rei das Algemas".
Ele começou a trabalhar em uma nova façanha para chocar e surpreender a plateia. A inspiração para seu truque veio através de um colega que trabalhava para uma instituição para doentes mentais. Houdini havia visitado o local e assistiu um interno lutando para se livrar de uma camisa de força. Convencido de que poderia escapar, ele praticou ao longo de semanas até conseguir desenvolver uma técnica que envolvia distender os músculos para possibilitar a fantástica fuga. O número foi um sucesso.
Houdini estava sempre atento para o gosto popular e na virada do século, apresentações envolvendo espíritos estavam no auge. Houdini concebeu um truque que envolvia a invocação de um "espírito" imaterial. Amarrado a uma cadeira atrás de uma cortina, ele fingia entrar em transe mediúnico e comandava o espírito a se manifestar tocando um instrumento, agitando sinos e fazendo objetos voarem sobre a cabeça do público. Quando a cortina era baixada Houdini continuava amarrado, mas no instante seguinte era desamarrado pelo mesmo fantasma amigável.
Apesar de seu sucesso, Houdini ainda não estava satisfeito, ele prometeu à sua mulher que tentaria por mais um ano obter fama e riqueza e se elas não viessem abandonaria a carreira artística.
A guinada viria naquele mesmo ano. Houdini foi apresentado a Martin Beck um aclamado produtor de teatro vaudeville que ficou impressionado com os seus truques de escapada. Os dois então começaram a trabalhar em novos números cheios de dramaticidade e suspense. Eles criaram uma fuga de grilhões enquanto o mágico se mantinha pendurado de cabeça para baixo no alto de uma ponte. Em outro truque, com a colaboração da polícia de San Francisco, Houdini era aprisionado por seis algemas, uma jaqueta de contenção usada em criminosos violentos e grilhões nos pés, em seguida era colocado na parte de trás de um camburão. Ele não apenas se livrava de todos os mecanismos como saía dirigindo o veículo em menos de seis minutos. Beck ensinou a Houdini como usar o poder da mídia a seu favor.
O mágico anunciava seus fantásticos truques nos jornais e conclamava as pessoas a assistir seu show. Milhares de pessoas apareciam no local e testemunhavam suas escapadas fantásticas. Em uma ocasião 10 mil pessoas assistiram extasiadas a Houdini escapar de um baú onde havia sido trancafiado vestindo uma camisa de força.
Os jornais o transformaram do dia para a noite em sensação e seu nome chegou às alturas!
Em seguida ele recebeu convites para se apresentar no exterior e sua primeira turnê internacional foi um sucesso estrondoso. Na Inglaterra ele escapou de algemas usadas pela Scotland Yard, na França ele se pendurou sobre o Senna para escapar de grilhões nos pés e em Berlim ele se livrou de doze algemas em menos de 5 minutos. O nome de Houdini passou a ser sinônimo de espetáculo.
O grande mágico não perdia nenhuma oportunidade de publicidade. Quando Werner Graf, um chefe de polícia alemão o desafiou a escapar de uma algema que ele havia desenhado, Houdini não apenas se libertou como exigiu que o policial se desculpasse formalmente por questionar suas habilidades. Ao longo de sua carreira, Houdini aceitava desafios e testava quaisquer algemas que lhe enviassem.
Ele amava publicidade e desafios. Em 1902, Harry ficou sabendo que Engelberto Lepini um colega de profissão que se intitulava o "Mestre das Escapadas" havia dito que poderia derrotá-lo em uma competição de abrir algemas. Houdini que estava na Holanda, viajou para Dortmund onde Lepini se apresentava e disfarçado sentou na primeira fila para assistir ao show. Quando Lipini mencionou o desafio, Houdini revelou sua presença e subiu ao palco acenando um maço de notas totalizando 5000 marcos.
A proposta foi a seguinte: Lepini seria preso com uma algema preparada por Houdini e teria de abri-la, se tivesse sucesso receberia o dinheiro. Incentivado pelo público, Lepini aceitou o duelo combinado para o show da noite seguinte.
Na madrugada, Houdini foi visitado no hotel onde estava hospedado pelo agente de Lepini que pediu que ele fornecesse uma algema com um segredo que pudesse ser descoberto, em contra-partida, entregaria metade da renda do espetáculo. Houdini fingiu concordar e disse ao homem que o segredo para abrir o dispositivo consistia em girar os tambores até formar a palavra francesa "c-l-e-f-s" que significa chave. Lepini vestiu as algemas e ficou mais de 3 horas tentando se libertar até que se deu por vencido. Houdini então se apresentou girando os dispositivos que formaram a palavra "f-r-a-u-d" e abriu a algema. Ele havia mudado o segredo para humilhar seu desafiante.
Se a polícia não desafiasse Houdini numa cidade em que ele visitava, Houdini os desafiava. Em 1903 enquanto passava por Moscou ele desafiou o Chefe da Polícia local a prendê-lo em uma cela à prova de fuga usada para transportar os presos políticos para a Sibéria. Houdini foi despido, revistado e aprisionado em um cubículo de 3 metros quadrados com uma corrente de ferro nas mãos e outra nos pés. Ele conseguiu escapar do cubículo em meros 20 minutos. Indignado o chefe de polícia exigiu que ele contasse como havia feito para fugir, Houdini então cunhou a máxima dos ilusionistas: "Um mágico jamais revela seu segredo".
De volta à América ele realizou uma série de façanhas incríveis como escapar de um traje de mergulho pesando 62 quilos e escapar do interior de uma baleia empalhada.
Uma de suas mais famosas façanhas aconteceu em 1908. Houdini foi convidado a testar a cela à prova de fuga do "Corredor da Morte" no Presídio Federal de Washington DC. Ele foi trancafiado sem roupas numa das celas e desafiado a escapar antes do amanhecer. Trabalhando rápido, ele não apenas escapou de sua cela como abriu a porta de todos os outros prisioneiros que estavam no bloco e pediu que eles trocassem de lugar. Os prisioneiros não se importaram de fazer o que ele havia pedido, na verdade ficaram bastante satisfeitos em cooperar. O feito foi realizado em exatos 27 minutos.
Em Detroit, Houdini foi preso com duas algemas e lançado do alto de uma ponte nas águas de um rio diante de um público de 10 mil pessoas. Ele conseguiu escapar, mas por pouco não acabou se afogando nas águas geladas. O truque foi o prelúdio para seu mais famoso número: a Fuga da Prisão de Água.
Apresentado pela primeira vez em 1912, o número consistia em Houdini - devidamente preso com algemas - ser mergulhado em uma caixa de vidro cheia de água da qual ele tinha de escapar antes de se afogar. O mágico sugeria ao público que tentasse ficar sem respirar enquanto ele se mantinha submerso lutando contra as correntes que restringiam seus movimentos. A plateia conseguia controlar a respiração por 30-40 segundos, Houdini ficava quase 2 minutos de baixo da água. Quando o público se perguntava se ele não havia se afogado e o agente de segurança preparava um machado para quebrar o vidro, o mágico emergia vitorioso para receber os aplausos enlouquecidos do teatro.
Houdini manteve seu nome nos jornais e atraiu enorme público para os teatros onde se apresentou. No começo do século ele era o maior astro do entretenimento no mundo: rico, famoso e bem sucedido.
Mas se profissionalmente ele era um sucesso, sua vida pessoal estava em ruínas. Abalado pela morte de sua mãe, Houdini sofria de depressão e tentava de toda forma entrar em contato com a mãe através de espiritualistas. Sua obsessão em saber se a mãe estava bem no "outro lado", o transformou em um debunker, um mágico especializado em desmascarar médiuns fraudulentos.
Seu corpo também dava sinais de desgaste pelos abusos aos quais era sujeito. Sabendo que não poderia continuar nesse ritmo, Houdini começou a pesquisar truques de ilusionismo mudando - ao menos em parte - o foco de suas apresentações.
Em 1918, Houdini realizou um de seus mais notáveis truques de ilusionismo no Hipódromo de Nova York. Ele chamou o truque de "O Desaparecimento do Elefante" e para esse truque contou com a participação de Jenny, um paquiderme de 5 toneladas que era colocado em uma caixa de madeira. Houdini erguia uma cortina que tampava a caixa e disparava uma pistola contra a caixa. Em seguida baixava a cortina para mostrar as marcas de bala que haviam atravessado a madeira. Ao abrir a caixa, o elefante simplesmente havia desaparecido.
Um crítico da época escreveu as seguintes palavras: “Com este sensacional truque, Houdini deixa de ser apenas o Mestre das Escapadas e se torna o Mestre dos Mágicos".
Ele realizou centenas de outros truques: desaparecimento, flutuação, espadas que caíam, assistentes serrados ao meio, animais que surgiam e desapareciam... na verdade, aquilo que se conhece no mundo do entretenimento por espetáculo de mágica foi uma invenção de Harry Houdini.
Mas o fim viria de forma surpreendente: em uma tarde de Outubro de 1926, Houdini terminou de dar uma palestra, quando um estudante se aproximou perguntando se era verdade que Houdini era capaz de suportar poderosos socos no estômago. Ele respondeu que sim, já que este era um truque que ele havia aprendido em seus dias de circo anos antes. Acreditando que Houdini havia dado a ele o sinal verde para testar o truque, o estudante desferiu quatro socos em seu abdômen. Houdini não teve tempo de explicar que precisava se preparar para suportar os socos e desabou no chão. Seus amigos tentaram deter o estudante, mas Houdini confirmou o mal entendido e ainda deu a ele convites para sua próxima apresentação.
Houdini insistiu em se apresentar nos dias seguintes embora estivesse sentindo dores horríveis. Após uma apresentação, ele finalmente concordou que deveria ver um médico e foi diagnosticado com apendicite aguda agravada pelos golpes sofridos. Ele se negou a fazer uma cirurgia de emergência e viajou para Detroit para cumprir sua agenda. Ao saltar do trem, Houdini estava com febre alta, mesmo assim se apresentou para seu público dizendo as seguintes palavras: "Essas pessoas vieram me ver. Eu não vou desapontá-las".
O mágico conseguiu suportar as dores escruciantes e completou o show e literalmente desabou assim que a cortina foi baixada. Houdini foi examinado os médicos diagnosticaram que ele havia sofrido uma ruptura no apêndice - na verdade os cirurgiões não conseguiam entender como ele conseguiu ainda se apresentar com um quadro de tamanha gravidade.
Ele ainda suportou três dias antes de sucumbir.
Os jornais do dia seguinte noticiaram que o maior artista do entretenimento, havia deixado o palco da vida e entrado no célebre hall das lendas.