Victor de Aveyron (nascido cerca de 1787, morreu em 1828) foi uma criança selvagem que foi encontrada na França em 1798, sendo adotado então pelo educador Jean-Marc Gaspard Itard. A história ganhou tons folclóricos com o tempo, com várias versões, chegando a ser confuso saber o que é realidade e o que é fantasia. Sua história virou tema de séries, filmes, telenovelas, desenhos animados etc. A grande maioria destas histórias têm como base os relatos deixados por Itard em relação a Victor de Aveyron.
No dia 09 de janeiro de 1799, uma estranha criatura surgiu dos bosques próximos ao povoado de Saint-Serin, no sul da França. Apesar de andar em posição ereta, se assemelhava mais a um animal do que a um ser humano, porém, imediatamente foi identificado como um menino de uns onze ou doze anos. Unicamente emitia estridentes e incompreensíveis grunhidos e parecia carecer do sentido de higiene pessoal, fazia suas necessidades onde e quando lhe apetecia. Foi conduzido para a polícia local e, mais tarde, para um orfanato próximo.
A princípio escapava constantemente e era difícil voltar a capturá-lo, agindo sempre como um animal. Negava-se a vestir-se e rasgava as roupas quando lhes punham. Nunca houve pais que o reclamassem. Portanto era um mistério; com isso, a polícia começou a suspeitar que o garoto fosse uma criança abandonada à própria sorte no bosque, com a intenção que morresse com fome ou devorado por feras; essa atitude era muito comum na época por causa da pobreza extrema logo após o conturbado período da Revolução Francesa.
O menino foi submetido a um minucioso exame médico no qual não se encontrou nenhuma anormalidade importante. Quando foi colocado diante de um espelho parece que viu sua imagem sem reconhecer-se a si mesmo. Em uma ocasião tratou de alcançar através do espelho uma batata que havia visto refletida nele (de fato, a batata era segurada por alguém atrás de sua cabeça). Depois de várias tentativas, e sem voltar a cabeça, colheu a batata por cima de seu ombro.
Um sacerdote que observava ao menino diariamente descreveu esse incidente da seguinte forma: “todos estes pequenos detalhes, e muitos outros que poderiam aludir, demonstram que este menino não carece totalmente de inteligência, nem de capacidade de reflexão e raciocínio. Contudo, nos vemos obrigados a reconhecer que, em todos os aspectos que não tem a ver com as necessidades naturais ou a satisfação dos apetites, se percebe nele um comportamento puramente animal. Se possui sensações não desembocam em nenhuma ideia. Nem sequer pode comparar umas as outras. Poderia pensar-se que não existe conexão entre sua alma ou sua mente e seu corpo”.
Posteriormente, o menino foi enviado para Paris, onde se ocorreram tentativas sistemáticas de transformar-lhe “de besta em humano”. O esforço resultou só parcialmente satisfatório. Aprendeu a utilizar o banheiro, aceitou usar roupa e aprendeu a vestir-se sozinho. No entanto, não lhe interessavam nem as brincadeiras nem os jogos e nunca foi capaz de articular mais que um reduzido número de palavras. Até onde sabemos pelas detalhadas descrições de seu comportamento e suas reações, a questão não era a de que fosse retardado mental. Parece que ou não desejava dominar totalmente a fala humana ou que era incapaz de fazê-lo. Com o tempo fez escassos progressos e morreu em 1828, quando tinha por volta de quarenta anos.
Há várias histórias das chamadas “crianças selvagens” em várias partes do mundo. Essas histórias corroboram com as psicologias da educação e do desenvolvimento ao afirmarem que nós nos tornamos humanos por conta da educação e da convivência com outros humanos parecidos conosco; aí está uma questão antropológica da força da cultura sobre os indivíduos.