Espírito batedor de Bergzabern. Mistério Resumo.

Fonte da Informação A Era do Espírito.


(PRIMEIRO ARTIGO.)

Nós já havíamos ouvido falar de certos fenômenos espíritas que fizeram muito ruído em 1852, na Bavière renana, nas proximidades de Spire, e sabíamos que um relato autêntico deles havia sido publicado numa brochura alemã. Depois de pesquisas, por longo tempo infrutíferas, uma senhora, entre os nossos assinantes de Alsace, e que manifestou, nessa circunstância, um zelo e uma perseverança da qual lhe somos infinitamente reconhecidos, conseguiu, enfim, adquirir para si essa brochura, que fez o obséquio de nos endereçar. Damos-lhe a tradução in extenso, será lida, sem dúvida, com tanto mais interesse por ser, entre tantas outras, uma prova a mais de que fatos desse gênero são de todos os tempos e de todos os países, visto que estes, dos quais tratamos, se passaram numa época em que apenas se começava a falar dos Espíritos.

PREFÁCIO

Um acontecimento estranho e, desde há vários meses, o assunto de todas as conversas de nossa cidade e dos arredores.  Queremos falar do Batedor, como é chamado, da casa do alfaiate Pierre Sanger.

Até então, nos abstivemos de qualquer narração, em nosso jornal (Journal de Bergzabern) sobre as manifestações que se produziram nessa casa desde o dia 19 de janeiro de 1852; como, porém, despertaram a atenção geral, a tal ponto que as autoridades creram dever pedir ao doutor Beutner uma explicação a esse respeito, e que o doutor Dupping, de Spire, se postou mesmo sobre os lugares para observar os fatos, não podemos adiar por mais tempo em comunicá-las ao público.

Nossos leitores não esperem de nós um julgamento sobre a questão, no qual ficaríamos muito embaraçados; deixamos esse encargo àqueles que, pela natureza dos seus estudos e da sua posição, estão mais aptos a se pronunciarem, o que, aliás, farão sem dificuldade se chegarem a descobrir a causa desses efeitos. Quanto a nós, limitar-nos- emos à narração dos fatos, principalmente daqueles dos quais fomos testemunhas, ou que temos de pessoas dignas de fé, deixando ao leitor formar a sua opinião.

F. A. BLANCK, Redator do Journal de Bergzabem.

MAIO DE 1852

No dia 19 de janeiro deste ano (1852), a família Pierre Sanger, de Bergzabem, ouviu na casa que habitava, e num quarto vizinho do qual ficava comumente, como um martelamento que começava primeiro por golpes surdos, parecendo virem de longe, que se tornavam depois mais fortes e mais e mais marcantes.  Esses golpes pareciam ser dados sobre a parede, junto à qual estava colocada a cama onde dormia seu filho, com a idade de onze anos.  Habitualmente, era entre nove horas e meia e dez horas e meia que o ruído se fazia ouvir. O casal Sanger primeiro não lhes deu atenção, mas, como essa singularidade se renovava a cada noite, pensaram que isso podia provir da casa vizinha, onde um enfermo se divertia, à guisa de passatempo, em bater o tambor na parede. Logo se convenceu que esse enfermo não existia e não podia ser a causa desse ruído. Removeu-se o solo do quarto, derrubou-se a parede, mas sem resultado. A cama foi transportada para o lado oposto do quarto; então, coisa espantosa, foi desse lado que o ruído ocorreu, e logo que a criança adormecia.

Estava claro que a criança estava, de algum modo, na manifestação do ruído, e se supôs, depois que todas as pesquisas da polícia nada descobriram, que esse fato deveria ser atribuído a uma enfermidade da criança ou uma particularidade de sua conformação. Todavia, nada, até então, veio confirmar essa suposição. É, ainda, um enigma para os médicos.

No entanto, a coisa não faz senão desenvolver-se; o ruído se prolonga além de uma hora e as pancadas têm mais força. A criança foi mudada de quarto e de cama, o batedor se manifesta nesse novo quarto, sob o leito, no leito e na parede. As pancadas não eram idênticas; eram ora fortes, ora fracas e isoladas, ora, enfim, se sucediam rapidamente, e segundo o ritmo de marchas militares e de danças.

A criança ocupava, há alguns dias, o acima mencionado quarto, quando se nota que, durante o sono, emitia palavras breves, incoerentes. As palavras tomam-se logo mais distintas e mais inteligentes; parecia que a criança se entrelinha com um outro ser, sobre o qual tinha a autoridade. Entre os fatos que se produziam cada dia, o autor desta brochura narrará um do qual foi testemunha: Estava a criança em sua cama, deitada sobre o lado esquerdo. Apenas adormeceu, os golpes começaram e ela se pôs a falar da espécie: "Tu, tu, bate uma marcha". E o batedor bate uma marcha, bastante parecida com uma marcha bávara. À ordem de "Alto!" da criança, o batedor pára. A criança diz então: "Bate três, seis, nove vezes", e o batedor executa a ordem.  Sob uma nova ordem de bater 19 golpes, 20 golpes se fizeram ouvir, a criança sonolenta diz: "Não está bem, foram 20 golpes," e logo 19 golpes foram contados.  Em seguida, a criança pede 30 pancadas; ouvem-se 30 golpes. "100 pancadas." Não se pôde contar senão até 40, tão rapidamente se sucediam as pancadas. Ao último golpe a criança disse: "Muito bem; agora 110." Aqui não se pôde contar senão até perto de 50.  Ao último golpe, o dorminhoco disse: "Não é isso, não foram senão 106," e logo 4 pancadas se fizeram ouvir para completarem o número de 110.  O menino pede em seguida: "Mil!" Não foram dados senão 15 golpes. "Bem, vamos!" Ocorreram, ainda, 5 pancadas e o batedor se detém.

Veio, então, na ideia dos assistentes, comandarem, eles mesmos, o batedor, que executa as ordens que lhe dão. Ele silenciava à ordem de "Alto! Silêncio! Sossega!" Depois, por si mesmo e sem ordem, começava a bater. Um dos assistentes disse, baixinho, em um canto do quarto, que que- ria mandar, unicamente pelo pensamento, que golpeasse 6 vezes. O experimentador se coloca, então, diante da cama e não diz uma única palavra: ouvem-se 6 pancadas. Mandam-se, ainda pelo pensamento, 4 golpes: quatro pancadas foram dadas. A mesma experiência foi tentada por outras pessoas, que não se saíram bem.

Logo o rapaz estende os membros, afasta a coberta e se levanta. Quando se lhe perguntou o que havia ocorrido, respondeu ter visto um homem grande e com cara de mau, que se mantinha diante da sua cama e lhe comprimia os joelhos. Acrescentou que sentia dor nos joelhos, quando esse homem batia. A criança dormiu de novo e as mesmas manifestações se reproduziram até o momento em que o relógio do quarto soou onze horas. De repente, o batedor se calou, a criança entrou num sono tranquilo, que se reconheceu pela regularidade da respiração, e nessa noite nada mais se fez ouvir. 

Notamos que o batedor batia, sob a ordem que recebia, marchas militares. Várias pessoas afirmam que, quando se pedia uma marcha russa, austríaca ou francesa, ela era batida com exatidão.

No dia 25 de fevereiro, estando dormindo, o menino disse: "Não queres mais bater agora, queres raspar, muito bem! quero ver como o farás." E, com efeito, no dia seguinte, em lugar de pancadas, ouve-se uma raspadura que parecia vir da cama, e que está se manifestando até este dia. Os golpes se misturaram à raspadura, ora alternadamente, ora simultaneamente, de tal modo que, nas músicas de marcha ou de dança, a raspadura faz a primeira parte, e os golpes a segunda. De acordo com o pedido, a hora do dia, a idade das pessoas presentes são indicadas por raspadura ou golpes secos. Com respeito à idade das pessoas, algumas vezes havia erro; mas era retificado na 2ª ou 3ª vez, quando se lhe dizia que o número de golpes não era exato. Muitas vezes, em lugar de responder executa uma marcha.

A linguagem da criança, durante o sono, torna-se, dia a dia, mais perfeita. O que não eram primeiro senão simples palavras, ou ordens muito breves ao batedor, mudam, em sequência, numa conversação seguida com seus parentes. Assim, um dia ele se entrelinha com sua irmã mais velha, sobre assuntos religiosos e num tom de exortação e de instrução, dizendo-lhe que deveria ir à missa, orar todos os dias, e mostrar submissão e obediência a seu pai e mãe. A noite, retoma os mesmos assuntos de conversa; em seus ensinamentos, nada tinha de teológico, mas, unicamente, noções que se aprendem na escola.

Antes de suas conversas, ouviam-se, pelo menos durante uma hora, golpes e raspadura, não somente durante o sono do menino, mas mesmo quando este estava no estado de vigília.  Vimo-lo beber e comer enquanto os golpes e as raspaduras se manifestavam, e vimo-lo também, no estado de vigília, dar ordens ao batedor, que foram todas executadas.

Sábado à noite, 6 de março, tendo o menino de dia, e muito desperto, predito ao seu pai que o batedor apareceria às nove horas, várias pessoas se reuniram na casa de Sanger. Soando as nove horas, quatro pancadas tão violentas foram dadas contra a parede que os assistentes com elas se assustaram. Logo, e pela primeira vez, os golpes foram dados na madeira da cama e exteriormente; toda a cama, com eles, se agitou. Esses golpes se manifestaram por todos os lados da cama, ora em um lugar ora noutro. Os golpes e a raspadura se alternaram na cama. Sob as ordens do rapaz e das pessoas presentes, as pancadas se faziam ouvir, seja no interior da cama, seja no exterior. De repente, a cama se ergue em sentidos diferentes, enquanto as pancadas eram dadas com força. Mais de cinco pessoas tentaram, contudo, em vão, fazer cair a cama erguida; tendo-a, então, abandonado, ela se balança ainda alguns instantes, depois retoma a sua posição natural. Esse fato já ocorrera uma vez anteriormente, nessa manifestação pública.

Cada noite, também, o menino fazia uma espécie de discurso. Disso vamos falar muito sucintamente.

Antes de tudo, é preciso anotar que, logo que deixava cair sua cabeça, o menino dormia, e os golpes e a raspadura começavam. Aos golpes a criança gemia, agitava suas pernas e parecia não se sentir bem. Não ocorria o mesmo na raspadura. Quando chegava o momento de falar, o rapaz se deitava sobre o dorso, sua feição se tornava pálida, assim como suas mãos e seus braços. Fazia sinal com a mão direita e dizia: "Vamos! vem diante de minha cama e junta as mãos, vou falar-te do Salvador do mundo." Então os golpes e a raspadura cessavam, e todos os assistentes escutavam, com uma atenção respeitosa, o discurso do dorminhoco.

Ele falava lentamente, muito ininteligivelmente e em puro alemão, o que surpreendia tanto mais quanto o menino era menos adiantado do que os seus colegas em suas aulas, o que provinha, sobretudo, de um mal dos olhos que o impedia de estudar. Suas conversas giravam em torno da vida e das ações de Jesus, desde seu décimo-segundo ano, de sua presença no templo com os escribas, dos seus benefícios para com a Humanidade e dos seus milagres; em seguida, estendia-se no relato dos seus sofrimentos, e criticava severamente os Judeus por terem crucificado Jesus, apesar de suas numerosas bondades e das suas bênçãos. Terminando, o menino dirigia a Deus uma fervorosa prece, "de lhe conceder a graça de suportar, com resignação, os sofrimentos que lhe enviara, uma vez que havia escolhido entrar em comunicação com o Espírito." Pedia a Deus para não deixá-lo morrer ainda, pois não era senão uma criança, e que não queria baixar à tumba escura. Terminados seus discursos, recitava com voz solene o Paternoster, depois do que dizia: "Agora podes vir", e logo os golpes e as raspaduras recomeçavam.  Fala ainda duas vezes ao Espírito, e, a cada vez, o Espírito batedor se detinha. Dizia, ainda, algumas palavras e depois: "Agora podes ir em nome de Deus." E despertava.

Durante as suas conversas, os olhos do menino estavam bem fechados; mas seus lábios se movimentavam; as pessoas que estavam mais próximas do leito, puderam notar esse movimento.  A voz era pura e harmoniosa.

Em seu despertar, perguntava-se-lhe o que havia visto e o que se passara.  Ele respondia: "O homem que vem me ver. - Onde se acha? - Perto de minha cama com outras pessoas. - Vistes as outras pessoas? - Vi todas as que estavam perto do meu leito."

Compreender-se-á, facilmente, que semelhantes manifestações encontraram muitos incrédulos, e que se supôs que toda essa história não era senão uma mistificação; mas o pai não era capaz de charlatanice, sobretudo de uma charlatanice que teria exigido toda a habilidade de um prestidigitador profissional; ele gozava da reputação de um bravo e honesto homem.

Para responder a essas suposições e fazê-las cessar, transportou-se o menino para uma casa estranha.  Logo que ali chegou, os golpes e as arranhaduras se fizeram ouvir.  Além do mais, alguns dias antes, o menino tinha ido com sua mãe a uma pequena vila chamada Capelle, a cerca de meia légua dali, na casa da viúva Klein; disse que estava cansado; deitam-no em um canapé e logo o mesmo fenômeno ocorreu. Várias testemunhas podem afirmar o fato. Se bem que o menino parecia passar bem de saúde, não obstante deveria estar afetado por alguma doença, que seria provada senão pelas manifestações relatadas acima, pelo menos pelos movimentos involuntários dos músculos e os sobressaltos nervosos.

Faremos notar, terminando, que o menino foi conduzido, há algumas semanas, à casa do doutor Beutner, onde deveria permanecer, para que esse sábio pudesse estudar, mais de perto, os fenômenos em questão. Desde então, todo ruído cessou na casa de Sanger e se produziu na do doutor Beutner.

Tais são, em toda a sua autenticidade, os fatos que se passaram. Entregamo-los ao público sem emitir julgamento. Possam os homens da arte dar-lhes, em breve, uma explicação satisfatória.

BLANCK.
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ESPÍRITO BATEDOR DE BERGZABERN.

A explicação solicitada pelo narrador que acabamos de citar, é fácil de ser dada; não há senão uma, e só a Doutrina Espírita pode fornecê-la. Esses fenômenos nada têm de extraordinário para quem esteja familiarizado com aqueles aos quais os Espíritos nos habituaram. Sabe-se qual papel certas pessoas fazem a imaginação representar; sem dúvida, se o menino não tivesse tido senão visões, os partidários da alucinação estariam em condições favoráveis; mas aqui havia efeitos materiais de uma natureza inequívoca, que tiveram um grande número de testemunhas, e seria preciso supor que todas estavam alucinadas ao ponto de crerem que ouviam o que não ouviam, e vissem se movimentarem móveis imóveis; ora, haveria nisso um fenômeno mais extraordinário ainda. 

Não resta aos incrédulos senão um recurso, o de negarem; é mais fácil e isso dispensa raciocinar.

Examinando a coisa do ponto de vista espírita, fica evidente que o Espírito que se manifestou era inferior ao do menino, uma vez que lhe obedecia; estava mesmo subordinado aos assistentes, uma vez que também podiam comandá-lo. Se não soubéssemos, pela Doutrina, que os Espíritos dito batedores estão na base da escala, o que se passou disso seria uma prova. Não se conceberia, com efeito, que um Espírito elevado, não mais do que os nossos sábios e nossos filósofos, viesse se distrair batendo marchas e valsas, representando, em uma palavra, o papel de malabarista, nem se submeter aos caprichos de seres humanos. Ele se apresenta sob os traços de um homem de mau aspecto, circunstância que não pode senão corroborar esta opinião; o moral se reflete, em geral, sobre o envoltório. Está, pois, averiguado por nós que o batedor de Bergzabern é um Espírito inferior, da classe dos Espíritos levianos, que se manifestou como tantos outros o fizeram e o fazem todos os dias.

Agora, com qual objetivo veio? A notícia não diz se foi chamado; hoje, quando se está mais experimentado sobre essa espécie de coisas, não se deixaria chegar um visitante tão estranho sem se informar por que veio. Não podemos, pois, senão estabelecer uma conjectura. E certo que ele nada fez que revele maldade ou má intenção; o menino não sofreu nenhuma perturbação, nem física nem moral; só os homens teriam podido perturbar seu moral ferindo sua imaginação com contos ridículos, e é feliz porque não hajam feito. Esse Espírito, por inferior que fosse, não era, pois, nem mau nem malevolente; era simplesmente um desses Espíritos, tão numerosos, dos quais estamos, sem cessar, rodeados sem o sabermos. Poderia agir, nessa circunstância, por um simples efeito do seu capricho, como também poderia fazê-lo por instigação de Espíritos elevados, tendo em vista despertar a atenção dos homens e convencê-los da realidade de um poder superior fora do mundo corpóreo.

Quanto ao menino, é certo que era um desses médiuns de influência física, dotados, sem o saberem, dessa faculdade, e que são para os outros médiuns o que os sonâmbulos naturais são para os sonâmbulos magnéticos. Essa faculdade dirigida com prudência, por um homem experimentado na nova ciência, teria podido produzir coisas mais extraordinárias ainda e de natureza a lançarem uma nova luz sobre esses fenômenos, que não são maravilhosos senão porque não são compreendidos.

O ESPÍRITO BATEDOR DE BERGZABERN.
(SEGUNDO ARTIGO.)
JUNHO DE 1858

Extraímos as passagens seguintes de uma nova brochura alemã, publicada em 1853 pelo senhor Blank, redator do jornal de Bergzabem, sobre o Espírito batedor do qual falamos em nosso número do mês de maio. Os fenômenos extraordinários que nele são relatados, e cuja autenticidade não se poderá contestar, provam que nada temos a invejar, sob esse aspecto, à América. Notar-se-á, nesse relato, o cuidado minucioso com o qual os fatos foram observados. Seria desejável que se aplicasse sempre, em semelhante caso, a mesma atenção e a mesma prudência.  Sabe-se, hoje, que os fenômenos desse gênero não são o resultado de um estado patológico, mas denotam sempre, entre aqueles em que se manifestam, uma excessiva sensibilidade fácil em superexcitar-se. O estado patológio não é a causa eficiente, mas pode ser consecutiva. A mania da experimentação, em casos análogos, mais de uma vez foi causa de acidentes graves que não teriam ocorrido se se tivesse deixado a Natureza agir por si mesma. Encontrar-se-á em nossa Instruções práticas sobre as manifestações espíritas, (1) conselhos necessários para esse fim.

Sigamos o senhor Blanck em seu relato.

"Os leitores da nossa brochura intitulada: Os Espíritos batedores, viram que as manifestações de Philippine Senger têm um caráter enigmático e extraordinário. Contamos esses fatos maravilhosos desde o seu começo até o momento em que o menino foi levado ao médico real do lugar. Agora, vamos examinar o que se passou depois até este dia.

Quando a criança deixa a residência do doutor Bentner para entrar na casa paterna, a batida e a arranhadura recomeçaram na casa do pai Senger; até essa hora, e mesmo depois da cura completa da jovem, as manifestações foram mais marcantes, e mudaram de natureza (2). Nesse mês de novembro (1852), o Espírito começa a assobiar, em seguida, ouve-se um ruído comparável ao da roda de um carrinho de mão, virando sobre o seu eixo seco e enferrujado; mas o mais extraordinário de tudo, sem contradita, foi a desordem dos móveis no quarto de Philippine, desordem que se prolongou por quinze dias.

Uma curta descrição dos lugares me parece necessária.

Esse quarto tem em torno de 18 pés de comprimento por 8 de largura; chega-se a ele pela sala comum. A porta que faz essas duas peças se comunicarem, abre-se à direita. A cama da criança estava colocada à direita; no meio, um armário e, no canto esquerdo, a mesa de trabalho de Senger, na qual foram feitas duas cavidades circulares, cobertas por tampas.

À noite, quando começou a volta pela casa, a senhora Senger e sua filha mais velha Francisque estavam sentadas na primeira sala, perto de uma mesa e ocupadas em debulhar feijão; de repente, uma pequena roda, lançada do quarto de dormir, cai perto delas. Ficaram mais amedrontadas, visto que sabiam que ninguém além de Philippine, então mergulhada no sono, se encontrava no quarto; além disso, a rodinha fora lançada do lado esquerdo, ao passo que se encontrava na prateleira de um pequeno móvel colocado à direita. Se houvesse partido da cama, deveria encontrar a porta e aí se deter, ficava, pois, evidente, que a criança não havia participado desse fato. Enquanto a família Senger expressava sua surpresa com esse acontecimento, alguma coisa caiu da mesa ao solo; era um pedaço de pano que, antes, estava de molho em uma bacia cheia de água. Ao lado da rodinha, jazia também uma cabeça de cachimbo sendo que a outra metade havia ficado sobre a mesa. O que tornava a coisa ainda mais incompreensível, era que a porta do armário, onde estava a rodinha antes de ser lançada, achava-se fechada, que a água da bacia não estava agitada, e que nenhuma gota havia entornado sobre a mesa. De repente, a criança, sempre adormecida, grita de sua cama: Pai, saia, ele lança! Saiam, ele vos lançará também. Obedeceram a essa ordem expressa; logo que foram à primeira sala, a cabeça de cachimbo lhes foi lançada com uma grande força, sem que, todavia, se quebrasse.

Uma régua da qual Philippine se servia na escola, tomou o mesmo caminho. O pai, a mãe e sua filha mais velha se olhavam com medo, e como refletissem quanto ao caminho a tomar, uma comprida plaina de Senger e um muito grosso pedaço de madeira foram lançados de seu banco de carpinteiro no outro quarto. Sobre a mesa de trabalho, as tampas estavam em seu lugar e, apesar disso, os objetos que cobriam foram semelhantemente lançados ao longe. Na mesma noite, os travesseiros da cama foram lançados sobre um armário e a coberta contra a porta.

Num outro dia, colocou-se aos pés da criança, sob a coberta, um ferro de engomar pesando em tomo de seis libras; pouco depois foi lançado no primeiro quarto; o cabo foi retirado e foi encontrado em uma cadeira do quarto de dormir.

Fomos testemunhas de que cadeiras colocadas em torno de três pés da cama foram derrubadas, e janelas abertas, embora tivessem sido fechadas antes, e isso logo que viramos as costas para entrarmos no primeiro aposento. Uma outra vez, duas cadeiras foram transportadas sobre o leito, sem desarrumar a coberta. Em 7 de outubro, tinha sido fechada solidamente a janela e fora estendido diante dela um pano branco.  Desde que deixamos a sala, batem-se golpes redobrados, e com tanta violência que tudo ali foi abalado e as pessoas que passavam na rua se apavoraram. Acorrendo-se à sala, a janela estava aberta, o pano lançado em um pequeno armário ao lado, a coberta da cama e os travesseiros por terra, as cadeiras derrubadas, e a criança no leito protegida só pela sua camisa. Durante quatorze dias, a senhora Senger não se ocupou senão em arrumar a cama.

Uma vez se havia deixado uma harmônica sobre uma cadeira; sons se fizeram ouvir; entrando-se precipitadamente no quarto, encontra-se, como sempre, a criança tranquila em sua cama; o instrumento estava sobre a cadeira, mas não vibrava mais. Uma noite, o senhor Senger saía do quarto da filha quando recebeu, nas costas, a almofada de uma cadeira. Uma outra vez, foi um par de velhas chinelas, sapatos que estavam sob a cama, tamancos que vieram ao seu encontro.  Muitas vezes também a vela acesa, colocada sobre a mesa de trabalho, foi soprada.  Os golpes e a arranhadura se alternavam com essa demonstração do mobiliário.  A cama parecia ser posta em movimento por mão invisível. À ordem de: Balançai a cama ou Embalai a criança, a cama ia e vinha, no comprimento e na largura, com ruído; à ordem de alto!  se detinha.  Podemos afirmar, nós que vimos, que quatro homens se sentaram sobre a cama, e mesmo nela foram suspensos sem poderem deter o movimento; foram erguidos com o móvel. Ao cabo de quatorze dias esses transtornos do mobiliário cessaram, e a essas manifestações sucederam outras.

No dia 26 de outubro, à noite, encontravam-se no quarto, entre outras pessoas, os senhores Louis Sochnée, licenciado em Direito, o capitão Simon, todos os dois de Wissembourg, assim como o senhor Sievert, de Bergzabern. Philippine Senger estava, nesse momento, mergulhada no sono magnético (3).  O senhor Sievert apresentou a esta um papel contendo dois cabelos para ver o que faria com ele.  Ela abre o papel, sem no entanto pôr os cabelos a descoberto, aplicou-os sobre as suas pálpebras fechadas, depois os afastou, como para examiná-los à distância, e disse: "Gostaria muito de saber o que contém esse papel... São dois cabelos de uma senhora que não conheço... Se ela quiser vir que venha... Não posso convidá-la, não a conheço." Às perguntas que lhe faz o senhor Sievert, ela não responde; mas, tendo colocado o papel na palma da sua mão, que ela estendeu e revirou, ali permaneceu suspenso. Ela o colocou na ponta do indicador e fez sua mão descrever, durante muito tempo, um semicírculo, dizendo: "Não caia," e o papel permaneceu na extremidade do dedo; depois, à ordem de: "Agora caia," ele se destacou sem que fizesse o menor movimento para determinar a queda.  Subitamente, virando para o lado da parede, ela disse: "Agora, quero te pregar na parede;" e ali aplicou o papel que permaneceu fixado em torno de 5 ou 6 minutos, depois do que o retirou. Um exame minucioso, do papel e da parede, não revelou nenhuma causa de aderência. Cremos que devemos fazer anotar que o quarto estava perfeitamente iluminado, o que nos permitiu dar-nos conta exata de todas essas particularidades.

No dia seguinte, à noite, se lhe dá outros objetos: chaves, moedas, charuteiras, relógios de bolso, anéis de ouro e de prata; e todos, sem exceção, permaneceram suspensos de sua mão. Anotou-se que a prata a ela aderia mais do que as outras matérias, porque se teve dificuldade em lhe arrancar as moedas, e essa operação lhe causou dor. Um dos fatos mais curiosos desse gênero foi o seguinte: no sábado, 11 de novembro, um oficial que estava presente lhe deu seu sabre com o cinturão, e o todo, que pesava 4 libras segundo constatação, permaneceu suspenso do dedo médio balançando por bastante tempo. O que não foi menos singular, foi que todos os objetos, qualquer que fosse a matéria, permaneceram igualmente suspensos.  Essa propriedade magnética se comunicava pelo simples contato das mãos com as pessoas suscetíveis da transmissão do fluido; disso tivemos vários exemplos.

Um capitão, o senhor cavaleiro de Zentner, aquartelado nessa época em Bergzabem, testemunha desses fenômenos, teve a idéia de colocar uma bússola perto da criança para observar-lhe as variações. Na primeira experiência, a agulha se desviou 15 graus, mas nas seguintes permanece imóvel, embora a criança tivesse a caixa em uma das mãos e a acariciasse com a outra. Essa experiência nos provou que esses fenômenos não poderiam se explicar pela ação do fluido mineral, tanto menos que a atração magnética não se exerce sobre todos os corpos indiferentemente.

Habitualmente, quando a pequena sonâmbula se dispunha a começar as suas sessões, ela chamava ao quarto todas as pessoas que ali se encontravam.  Dizia simplesmente: Vinde!  Vinde!  ou bem: Dai!  Dai! Frequentemente, não ficava tranquila senão quando todo o mundo, sem exceção, estava perto do seu leito. Ela pedia, então, com zelo e impaciência, um objeto qualquer; logo que se lhe havia dado, ele se ligava aos seus dedos. Ocorria, frequentemente, que dez, doze e mais pessoas estavam presentes, e que cada uma delas lhe entregava vários objetos. Durante a sessão ela não admitia que ninguém lhe tomasse a pedi-los; parecia, sobretudo, desejar os relógios; ela os abria com grande destreza, examinava o movimento, fechava-os, depois os colocava junto dela para examinar outra coisa. No final, devolvia a cada um o que se lhe havia confiado; examinava os objetos de olhos fechados e jamais se enganou de proprietário. Se alguém lhe estendesse a mão para pegar o que não lhe pertencesse, ela o repelia. Como explicar essa distribuição múltipla a um tão grande número de pessoas, sem erro?  Tentar-se-ia em vão fazê-lo por si mesmo de olhos abertos. Terminada a sessão e tendo os estranhos partido, os golpes e a arranhadura, momentaneamente interrompidos, recomeçavam.

É preciso acrescentar que a criança não queria que ninguém permanecesse ao pé do seu leito perto do armário, o que deixava entre os dois móveis um espaço em torno de um pé. Se alguém aí se metesse, ela o despedia com gesto. Se recusava, mostrava uma grande inquietação e ordenava, por gestos imperiosos, que deixasse o lugar. Uma vez ela exortou os assistentes a jamais se manterem no lugar protegido, porque não queria, disse ela, que ocorresse infelicidade a alguém. Essa advertência era tão positiva que ninguém, no futuro, a esqueceu.

Depois de algum tempo, ao ruído e à arranhadura se juntou um zumbido que se pode comparar ao som produzido por uma grossa corda de baixo; um certo silvo se misturava a esse zumbido. Se alguém pedisse uma marcha ou uma dança, seu desejo era satisfeito: o músico invisível se mostrava muito complacente. Com a ajuda da arranhadura, chama nominalmente as pessoas da casa ou os estranhos presentes; estes compreendem facilmente a quem se dirige. Ao chamado pela arranhadura, a pessoa designada responde sim, para dar a entender que sabe que se trata dela; então executa, em intenção, um trecho de música que dá, às vezes, lugar a cenas agradáveis. Se uma outra pessoa, que aquela chamada, respondesse sim, a arranhadura faria compreender, por um não, expresso à sua maneira, que não tinha nada a dizer-lhe para o momento.

Foi na noite de 10 de novembro que esses fatos se produziram pela primeira vez, e continuaram a se manifestar até este dia.

Eis agora como o espírito batedor procedia para designar as pessoas.

Depois de várias noites, notou-se que aos diversos convites para fazer tal ou tal coisa, ele respondia por um golpe seco ou por uma arranhadura prolongada. Logo que o golpe seco era dado, o batedor começava a executar o que se desejava dele; quando, ao contrário, ele arranhava, não satisfazia o pedido. Um medico teve, então, a ideia de tomar por um sim o primeiro ruído, e o segundo por um não, e, desde então, essa interpretação foi sempre confirmada. Anotou-se, também, que por uma série de arranhaduras mais ou menos fortes, o espírito exigia certas coisas das pessoas presentes. A força de atenção, e anotando a maneira pela qual o ruído se produzia, pôde-se compreender a intenção do batedor. Assim, por exemplo, o pai Senger contou que pela manhã, ao romper do dia, ouvia ruídos modulados de um certo modo; sem ligar-lhes primeiro nenhum sentido, notou que não cessavam senão quando estava fora da cama, de onde compreendeu que significavam: Levanta-te. Foi assim que, pouco a pouco, familiarizou-se com essa linguagem, e que por certos sinais as pessoas designadas puderam se reconhecer.

Chegou o aniversário do dia em que o espírito batedor havia se manifestado pela primeira vez; numerosas mudanças se operam no estado de Philippine Senger.  Os golpes, a arranhadura e o zumbido continuaram, mas a todas essas manifestações se juntou um grito particular que se assemelhava ora ao de um ganso, ora ao de um papagaio ou de qualquer outra grande ave; ao mesmo tempo ouvia-se uma espécie de picada contra a parede, semelhante ao ruído que faria um pássaro bicando.  Nessa época, Philippine Senger falava muito durante seu sono, e parecia, sobretudo, preocupada com um certo animal que se assemelhava a um papagaio, mantendo-se ao pé da cama, gritando e dando bicadas contra a parede.  Ao desejo de ouvir o papagaio gritar, este lançava gritos penetrantes. Colocaram-se diversas perguntas às quais fez responder por gritos do mesmo gênero; várias pessoas lhe mandaram dizer: Kakatoés, e ouviu-se, muito distintamente, a palavra Kakatoés, como se tivesse sido pronunciada pelo próprio pássaro. Silenciaremos os fatos menos interessantes, e nos limitaremos a narrar o que houve de mais notável sob o aspecto das mudanças sobrevindas no estado corporal da jovem.

Algum tempo antes do Natal, as manifestações se renovaram com mais energia; os golpes e a arranhadura tomaram-se mais violentos e prolongaram-se por mais longo tempo. Philippine, mais agitada que de costume, pedia, com frequência, não mais dormir em sua cama, mas na de seus pais; ela rolava na sua gritando: Não posso mais permanecer aqui; vou sufocar, socorro!  e sua calma não retornava senão quando era transportada para outra cama. Logo que ali se encontrava, pancadas muito fortes se faziam ouvir no alto; pareciam partir de um celeiro, como se um carpinteiro tivesse batido sobre vigas, sendo mesmo, algumas vezes, tão vigorosas que a casa era abalada, que as janelas vibravam, e que as pessoas presentes sentiam o solo tremer sob seus pés; golpes semelhantes eram igualmente batidos contra a parede, perto do leito. Às perguntas feitas, os mesmos golpes respondiam como de hábito, alternando-se sempre com a arranhadura.

Os fatos seguintes, não menos curiosos, foram muitas vezes reproduzidos.

Quando todo ruído havia cessado e a jovem repousava tranquilamente em sua pequena cama, frequentemente era vista prosternar-se de repente e juntar as mãos, tendo os olhos fechados; depois virava a cabeça para todos os lados, ora à direita ora à esquerda, como se alguma coisa extraordinária houvesse atraído sua atenção. Um sorriso amável, então, corria sobre os seus lábios; dir-se-ia que ela se dirigia a alguém; estendia as mãos, e, nesse gesto, compreendia-se que apertava as de alguns amigos ou conhecidos. Foi vista, também, depois de semelhantes cenas, retomar a sua primeira atitude suplicante, juntar de novo as mãos, curvar a cabeça até tocar a coberta, depois se endireitar e verter lágrimas. Suspirava então e parecia orar com um grande fervor. Nesses momentos, sua figura estava transformada; era pálida e tinha a expressão de uma mulher de 24 a 25 anos. Esse estado durava, frequentemente, mais de meia hora, estado durante o qual ela não pronunciava senão ah! ah! Os golpes, a arranhadura, o zumbido e os gritos cessavam até o momento do despertar; então o batedor se fazia ouvir de novo, procurando a execução de música alegre para dissipar a penosa impressão produzida sobre a assistência. Ao despertar, a criança estava muito abatida; podia com dificuldade levantar os braços, e os objetos que se lhe apresentava, não permaneciam mais suspensos de seus dedos.

Curiosos em conhecerem o que ela havia experimentado, a interrogaram várias vezes. Não foi senão sob reiteradas instâncias que ela se decidiu a dizer que havia visto conduzir e crucificar o Cristo, no Gólgota; que a dor das santas mulheres prosternadas ao pé da cruz, e a crucificação haviam produzido sobre ela uma impressão que não podia reproduzir. Havia visto também uma multidão de mulheres, e de jovens virgens em roupas negras, e pessoas jovens em longas roupas brancas, percorrerem processionalmente as ruas de uma bela cidade, e, enfim, se achou transportada para uma vasta igreja onde havia assistido a um serviço fúnebre.

Em pouco tempo o estado de Philippine Senger muda de modo a dar inquietação sobre a sua saúde, porque no estado de vigília ela divagava e sonhava em voz alta; não reconhecia nem seu pai, nem sua mãe, nem sua irmã, nem qualquer outra pessoa, e esse estado vinha ainda agravar-se com uma surdez completa, que persistia durante quinze dias.

Não podemos passar em silêncio o que ocorreu durante esse lapso de tempo.

A surdez de Philippine se manifestava do meio-dia às três horas, e ela mesma declarou que permanecerá surda durante um certo tempo e que cairá enferma. O que há de singular, é que, às vezes, ela recobrava o ouvido durante uma meia hora, com o que se mostrava feliz. Ela mesma predizia o momento em que a surdez deveria tomá-la e deixá-la. Uma vez entre outras, anunciou que à noite, às oito horas e meia, ela ouviria claramente durante uma meia hora; com efeito, na hora dita, seu ouvido havia voltado, e isso durou até as nove horas.

Durante sua surdez, seus traços estavam mudados; seu rosto tomava uma expressão de estupidez, que perdia logo que reentrava em seu estado normal. Nada, então, fazia impressão sobre ela; mantinha-se sentada, olhando as pessoas presentes com um olhar fixo e sem reconhecê-las. Não se podia fazer compreender senão por sinais aos quais, com frequência, não respondia, limitando-se a fixar os olhos sobre aquele que lhe dirigia a palavra. Uma vez agarrou, de repente, pelo braço, uma das pessoas presentes e lhe disse, empurrando-a: Quem és, pois? Nessa situação, permanecia, algumas vezes, mais de uma hora e meia imóvel em sua cama. Seus olhos estavam meio abertos e parados sobre um ponto qualquer, de tempo em tempo viravam à direita e à esquerda, depois retornavam ao mesmo lugar. Toda sensibilidade parecia, então, embotada nela; seu pulso batia com dificuldade, e quando se lhe colocava uma luz diante dos olhos, não fazia nenhum movimento: dir-se-ia morta.

Ocorreu, durante a sua surdez, que uma noite, estando deitada, ela pediu uma ardósia e giz, e depois escreveu: "As onze horas, direi alguma coisa, mas exijo que se mantenham tranquilos e silenciosos." Depois dessas palavras, acrescentou cinco sinais semelhantes aos da escrita latina, mas que nenhum dos assistentes pôde decifrar.  Escreveu-se na ardósia que não se compreendiam esses sinais. E resposta a essa observação, ela escreveu: "Não é que não podeis ler?' E mais embaixo: "Não é alemão, é uma língua es- trangeira." Em seguida, tendo retomado a ardósia, ela escreveu em outro lado "Francisque (sua irmã mais velha) se sentará nessa mesa e escreverá o que eu lhe ditarei." Acompanhou essas palavras de cinco sinais semelhantes aos primeiros, e devolveu a ardósia. Notando que esses sinais não haviam sido ainda compreendidos, pediu de novo a ardósia e acrescentou: "São ordens particulares."

Um pouco antes das onze horas, ela disse: "Ficai tranquilos, que todo mundo se sente e preste atenção!" e ao bater de onze horas, ela se vira em seu leito e cai em seu sono magnético comum. Alguns instantes depois, põe-se a falar, o que se prolonga, sem descontinuidade, durante uma meia hora. Entre outras coisas, declara que no corrente ano se produziriam fatos que ninguém poderia compreender, e que todas as tentativas feitas para explicá-los restariam infrutíferas.

Durante a surdez da jovem Senger, a desordem do mobiliário, a abertura inexplicada de janelas, a extinção das luzes colocadas sobre a mesa de trabalho, se renovaram várias vezes. Ocorreu uma noite, que dois bonés pendurados em um cabide do quarto de dormir, foram atirados sobre a mesa do outro quarto, e tombaram um copo cheio de leite, que se derramou na terra. As pancadas contra a cama eram tão violentas, que esse móvel foi deslocado; algumas vezes mesmo foi desmontada com estrondo, sem que as pancadas se fizessem ouvir.

Como havia ainda pessoas incrédulas, ou que atribuíam essas singularidades a um jogo da criança que, segundo elas, batia ou arranhava com seus pés e mãos, se bem que os fatos houvessem sido constatados por mais de cem testemunhas, e que fora verificado que a jovem tinha os braços estendidos sobre a coberta enquanto os ruídos se produziam, o capitão Zentner imaginou um meio para convencê-las. Fez trazer da caserna duas cobertas muito espessas, as quais foram colocadas uma sobre a outra, com ambas se envolvendo o colchão e os lençóis da cama; eram felpudas, de tal modo que era impossível nelas produzir o menor ruído pela fricção. Philippine, vestida com uma simples camisa e com uma camisola de dormir, foi colocada sob essas cobertas; apenas acomodada, a arranhadura e os golpes ocorreram como antes, ora contra a madeira da cama, ora contra o armário vizinho, segundo o desejo que era manifestado.

Ocorre, frequentemente, que quando alguém cantarola ou assobia uma música qualquer, o batedor o acompanha, e os sons que se percebem parece provirem de dois, três ou quatro instrumentos: ouve-se arranhar, bater, assobiar e ribombar ao mesmo tempo, segundo o ritmo da música cantada.

Frequentemente também, o batedor pede a um dos assistentes para cantar uma canção; ele o designa pelo procedimento que conhecemos, e quando este compreendeu que é a si que o Espírito se dirige, pergunta-lhe a seu turno se deve cantar tal ou tal música; e lhe é respondido por sim ou por não. A música indicada sendo cantada, um acompanhamento de zumbidos e assobios se faziam ouvir perfeitamente no compasso. Depois de uma música alegre, o Espírito pedia, muito frequentemente, a música: grande Deus nós te louvamos, ou a canção de Napoléon l. Se se lhe dissesse para tocar só esta última canção ou qualquer outra, a fazia ouvir desde o começo até o fim.

As coisas caminharam assim na casa de Senger, seja de dia, seja à noite, durante o sono ou no estado de vigília da criança, até 4 de março de 1853, época na qual as manifestações entraram em uma outra fase. Esse dia foi marcado por um fato mais extraordinário ainda que os precedentes.

NOTA.- Nossos leitores poderão estar descontentes, sem dúvida, pela extensão que demos a esses curiosos detalhes, e pensamos que lerão sua continuação com não menos interesse.  Anotaremos que esses fatos não nos vêm de países de além-mar, cuja distância, quando muito, é um grande argumento para certos céticos; não vêm mesmo de além Rhin, porque foi sobre as nossas fronteiras que eles se passaram, e quase sob os nossos olhos, uma vez que datam apenas de há seis anos.

Philippine Senger era, como se viu, uma médium natural muito complexa; além da influência que exercia sobre os fenômenos bem conhecidos dos ruídos e dos movimentos, era sonâmbula extática.  Conversava com os seres incorpóreos que via; via, ao mesmo tempo, os assistentes, e lhes dirigia a palavra, mas não lhes respondia sempre, o que prova que em certos momentos ela estava isolada.

Para aqueles que conhecem os efeitos da emancipação da alma, as visões que relatamos nada têm que não possa ser facilmente explicado; é provável que, nesses momentos de êxtase, o Espírito da criança se achasse transportado para algum país distante onde assistia, talvez em recordação, a uma cerimônia religiosa. Pode-se admirar da lembrança que guardava ao despertar, mas esse fato não é insólito; de resto, pode-se anotar que a lembrança era confusa, e que era preciso insistir muito para provocá-la.

Se se observar atentamente o que se passou durante a surdez, aí se reconhecerá, sem dificuldade, um estado cataléptico. Uma vez que essa surdez não era senão temporária, é evidente que não decorria da alteração dos órgãos do ouvido.  Ocorria mesmo a obliteração momentânea das faculdades mentais, obliteração que nada tinha de patológica, uma vez que, num dado instante, tudo retornava ao estado normal. Essa espécie de estupidez aparente prendia-se a um desligamento mais completo da alma, cujas excursões eram feitas com mais liberdade, e não deixavam aos sentidos senão a vida orgânica. Que se julgue, pois, o efeito desastroso que teria podido produzir um tratamento terapêutico em semelhante circunstância!  Fenômenos do mesmo gênero podem se produzir a cada instante; não saberíamos, nesse caso, recomendar mais circunspecção; uma imprudência pode comprometer a saúde e mesmo a vida.

O ESPÍRITO BATEDOR DE BERGZABERN.
(TERCEIRO ARTIGO.)
 JULHO DE 1858

Continuamos a citar a brochura do senhor Blanck, redator do Journal de Bergzabem (3).

"Os fatos que vamos relatar ocorreram de sexta-feira, 4, à quarta-feira, 9 de março de 1853; depois nada de semelhante se produziu.  Philippine nessa época não dormia mais no quarto que se conhece: sua cama havia sido transferida para o quarto vizinho, onde se encontra ainda agora. As manifestações tomaram um tal caráter de estranheza, que é impossível admitir a explicação desses fenômenos pela intervenção dos homens. Aliás, são tão diferentes daqueles que foram observados anteriormente, que todas as suposições iniciais desmoronaram.

Sabe-se que no quarto onde dormia a jovem, as cadeiras e outros móveis, frequentemente, eram transtornados, que as janelas se abriam com estrondo sob golpes redobrados. Há cinco semanas ela permanece no quarto comum, onde, chegada a noite, e até o dia seguinte, há sempre luz; pode-se, pois, ver perfeitamente o que aí se passa.

Eis o fato que foi observado sexta-feira, 4 de março.

Philippine não se havia ainda deitado; estava no meio de um certo número de pessoas que conversavam com o Espírito batedor, quando, de repente, a gaveta de uma mesa muito grande e muito pesada, que se achava no quarto, foi tirada e empurrada com um grande ruído e uma irascibilidade extraordinária. Os assistentes ficaram fortemente surpreendidos com essa nova manifestação; no mesmo momento a própria mesa se colocou em movimento, em todos os sentidos, e avançou para a chaminé junto da qual Philippine estava sentada. Perseguida, por assim dizer, por esse móvel, ela teve que deixar seu lugar e fugir para o meio do quarto; mas a mesa virou para essa direção e se deteve a meio pé da parede. Foi colocada no seu lugar costumeiro, de onde não se mexeu mais; mas as botas que se encontravam debaixo, e que todo o mundo pôde ver, foram lançadas ao meio do quarto, com grande pavor das pessoas presentes. Uma das gavetas começou a deslizar em suas corrediças, abrindo e fechando por duas vezes, primeiro muito vivamente, depois mais e mais lentamente; quando estava inteiramente aberta, ocorreu de ser sacudida com estrondo. Um pacote de tabaco deixado sobre a mesa, mudava de lugar a cada instante.  A batida e a arranhadura se fizeram ouvir na mesa.  Philippine, que gozava então de uma muito boa saúde, estava no meio da reunião e não parecia nada inquieta com todas essas estranhezas que se renovavam, cada noite, desde sexta-feira; mas no domingo elas foram ainda mais notáveis.

A gaveta foi várias vezes violentamente aberta e fechada.  Philippine, depois de estar em seu antigo quarto de dormir, tornou-se subitamente presa de sono magnético, se deixou cair numa cadeira, onde a arranhadura se fez ouvir várias vezes. As mãos da criança estavam sobre seus joelhos e a cadeira se movia ora à direita, ora à esquerda, para frente ou para trás. Viam-se os pés dianteiros da cadeira se erguerem, enquanto a cadeira se balançava, num equilíbrio espantoso, sobre os pés traseiros. Tendo sido Philippine transportada para o meio do quarto, foi mais fácil observar esse novo fenômeno. Então, ao comando, a cadeira virava, avançava ou recuava mais ou menos rápida, ora num sentido, ora no outro. Durante essa dança singular, os pés da criança, como paralisados, arrastavam no solo; esta se queixava de dor de cabeça por gemidos levando, diversas vezes, a mão à sua fronte; depois, despertada de repente, se pôs a olhar por todos os lados, não podendo compreender sua situação: seu mal-estar a havia deixado. Ela se deitou: então os golpes e a arranhadura, que se produziram na mesa, se fizeram ouvir na cama com força e de um modo alegre.

Algum tempo antes, tendo uma campainha produzido sons espontâneos, teve-se a ideia de fixá-la na cama, e logo se pôs a tocar e a se agitar. O que houve de mais curioso nessa circunstância foi que a cama, estando erguida e descolocada, a campainha permanecia imóvel e muda. Em mais alguns minutos todo o ruído cessou e a assembleia se retirou.

Na segunda-feira, a noite, 15 de maio, fixou-se na cama uma grande campainha; logo fez ouvir um ruído ensurdecedor e desagradável.  No mesmo dia, depois do meio-dia, a janela e a porta do quarto de dormir se abriram, mas silenciosamente.

Devemos narrar também que a cadeira, na qual Philippine se sentou na sexta-feira e no sábado, tendo sido levada pelo pai Senger para o meio do quarto, parecia muito mais leve que de costume: dir-se-ia que uma força invisível a sustentava.  Um dos assistentes, querendo empurrá-la, não experimentou nenhuma resistência, a cadeira parecia deslizar por si mesma sobre o assoalho.

O Espírito batedor permaneceu silencioso durante uns três dias, quinta-feira, sexta- feira e sábado santos.  Não foi senão no dia de Páscoa que seus golpes recomeçaram com o som de sinos, golpes ritmados que compuseram uma música.  No dia 1º de abril, as tropas mudando de guarnição, deixaram a cidade com música à frente.  Quando passavam diante da casa de Senger, o Espírito batedor executou, à sua maneira, contra a cama, o mesmo trecho que se tocava na rua.  Algum tempo antes, ouviu-se no quarto como passos de uma pessoa, e como se se tivesse lançado um sabre sobre as tábuas.

O governo de Palatinat preocupou-se com os fatos que acabamos de narrar, e propôs ao pai Senger colocar sua criança em uma casa de saúde em Frankenthal, proposta que foi aceita. Soubemos que, em sua nova residência, a presença de Philippine deu lugar aos prodígios de Bergzabern, e que os médicos de Frankenthal, tanto quanto os da nossa cidade, não puderam determinar-lhes a causa.  Estamos informados, por outro lado, que só os médicos têm acesso junto da jovem.

Por que tomou-se essa medida?

Ignoramos, e nos permitimos protestar; mas, se o que lhe ocasionou não foi o resultado de alguma circunstância particular, cremos que poder-se-ia deixar entrar, perto da criança, senão todo o mundo, ao menos as pessoas recomendáveis."


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